Motu proprio summorum pontificum:
Assistir ou não? eis a questão!
Traduzido da Revista Sel de la Terre, nº 70 (Couvent dela
Haye-aux-Bonshommes, 49240, AVRILLÉ – FRANCE).
Na saída da capela, o padre discute com um fiel, Filipe, de
17 anos. Durante a conversa, Filipe conta como se passou o seu último
fim-de-semana com amigos da região de Paris. Filipe diz que o grupo escolheu ir
à missa dos ralliés²…( Padre de Motu próprio)
Filipe: Mas porque este ar reprovador? Não é a missa
verdadeira?
Padre: Sem dúvida, a missa é boa. Mas isto não é o
principal.
Filipe: Não é o principal? Mas o que é que falta, padre?
Padre: Bem, vou fazer uma comparação. Um licor é uma boa
coisa, não é? (Filipe concorda com um sorriso). Pois bem. Mas cada vez que se
bebe um licor, não se faz necessariamente uma boa ação (Filipe compreende).
Ocorre algo de semelhante com a santa missa. Uma coisa é o fato de a missa ser,
em si mesma, uma boa coisa. Mas é preciso também que o assistir a essa missa
seja também bom; é necessário que a assistência a essa missa seja uma boa ação.
Filipe: Sim, mas um licôr e a missa não são a mesma coisa! O
senhor parece querer dizer que se pode fazer o mal assistindo à missa
tradicional!
Padre: Exatamente, é isto mesmo que eu quero dizer! Assim
como se pode fazer um mau uso de um licor, do mesmo modo não é sempre bom
assistir à verdadeira missa. Pode até ser um mal.
Filipe: Essa é a maior!
Padre: Caro Filipe, sua surpresa é um tanto compreensível.
Normalmente, um católico não tem motivos de se questionar quando assiste a uma
missa católica. Na atualidade, porém, existem muitas coisas anormais na Igreja.
Nós, por exemplo, celebramos a missa em salas improvisadas, enfrentando a
hostilidade do clero da região, estigmatizados, sendo considerados como
excomungados, cismáticos … Muita gente não vem aqui porque crêem que isto é
praticar o mal. E, no entanto, é realmente a verdadeira missa! O que ocorre, é
que eles se enganam pensando que é mal vir aqui.
Filipe: Sim, eles se enganam, já que aqui é a verdadeira
missa!
Padre: Não, Filipe, preste atenção. O problema deles não é a
missa. O problema deles é que lhes disseram que é mal ir a ela. É bem
diferente. Pois bem, o problema com os ralliés ( Padre de Motu próprio) é
do mesmo gênero: a sua missa é boa, certo, mas é bom ir a ela? Isto é uma outra
questão! Percebe a distinção?
Filipe: Sim, eu vejo a distinção. Mas eu não vejo realmente
porque não é bom ir a uma missa da Fraternidade São Pedro, ou de Cristo-Rei!
Padre: Veja, quando se começa a interrogar se assistir a tal
ou tal missa é bom ou não, passamos logo a falar daquele que celebra a missa.
Interessante, não?
Filipe: Não me parece muito claro…
Padre: Pois bem! Digamos como você acaba de fazer; eu vou à
verdadeira missa na Fraternidade São Pedro, em Cristo-Rei, na Fraternidade São
Pio X, na praça Foch, ou na rua Buisson, e a missa celebrada nestes diferentes
lugares é a mesma. Todavia, assistir aqui ou acolá, isto não é a mesma coisa.
Depende de quem a celebra.
Filipe: Por quê?
Padre: Porque a missa e um licor não são a mesma coisa! Há
pouco, você poderia ter me dito: quanto a mim, quando eu bebo um licor, eu me
previno. Jamais tenho problemas. Bebo sempre com moderação! Mas a missa não é
uma coisa que se consome sozinho num canto, de maneira privada.
Filipe: É então o que? Eu vou à missa para me recolher, para
rezar, para comungar. Pouco me importa se o padre é da Fraternidade São Pedro
ou São Pio X. Que os senhores se acertem!
Padre: A santa missa é o ato mais elevado do culto público
da Igreja. Quer dizer que é, antes de tudo, um ato social, no qual se honra o
nosso Deus e se recebe seus benefícios sob a autoridade da Igreja, sociedade
que Deus instituiu para poder ser honrado como Ele o quer.
Filipe: Hum… Um pouco difícil de entender, padre.
Padre: Vou recomeçar. Em privado, você pode rezar muito
livremente, quando quiser, como quiser; de qualquer maneira, trata-se de uma
oração. Mas o Bom Deus quis ser honrado também, e, sobretudo, reunindo os
homens em torno da cruz, para a missa; isso é que é a oração pública e oficial
da Igreja. É assim que ela presta a Deus, em nome de todos os homens, toda a
honra e glória que lhe são devidos. Portanto, a missa não é uma devoção privada
nem dos assistentes nem dos padres que a celebram. É um ato comum de culto, o
que supõe que aquele que celebra tenha recebido da Igreja a autoridade para o
fazer. Ele deve depender de um bispo, o qual depende do papa. É por isso que eu
falava da autoridade da Igreja.
Filipe: Mas o senhor, padre, o senhor é independente desta
autoridade.
Padre: Pois bem, Filipe, chegamos ao coração do problema. O
que você diz, é o que dizem os “conciliares” e os que creem neles, quando eles
dizem que assistir às nossas missas não é permitido. Mais uma vez, não é porque a missa que
celebramos seja má, mas porque nós resistimos à Hierarquia, a Roma. E nós
dizemos: não se deve assistir à missa dos ralliés ( Padre de Motu próprio) , porque eles se submetem à hierarquia
conciliar.
Filipe: Se bem compreendo, então o fundo do problema é o da
submissão á hierarquia atual?
Padre: Exatamente! Normalmente, na Igreja, um padre está
submetido a seu bispo, que está submetido ao papa; assim ele recebe uma missão
de celebrar a missa e os outros sacramentos para uma porção dos fiéis da
Igreja. Ora, desde umas três décadas constata-se que, para guardar a fé, os
fiéis pediram a padres, que também
queriam guardá-la, para que estes se ocupassem deles, a ponto de
resistir aos bispos e ao papa. Como bons Gauleses³, não queriam resistir por
resistir, mas queriam defender sua fé
diante das decisões de Roma, que contribuíam para a perda da fé dos
fieis.
Filipe: Que decisões?
Padre: Por exemplo, a promulgação da nova missa de Paulo VI,
em 1969. Mas antes, houve o Concílio, com
vários textos ruins, sobretudo sobre o ecumenismo e a liberdade
religiosa. Mais tarde, houve mudanças nos outros sacramentos, depois o novo
direito canônico, em 1983. Houve muitos escândalos de ecumenismo, como Assis,
em 1986. e depois, houve a luta feroz contra D. Lefebvre que só fazia, como ele
mesmo disse várias vezes, o que ele sempre tinha feito, com a aprovação de Roma.
Em 1988, D. Lefebvre sagrou bispos porque ele compreendeu que Roma queria
destruir a Tradição. A fé dos fiéis continuava sendo ameaçada. E isto é o
essencial que deve ser compreendido: a hierarquia, os bispos, o papa, estão nas
suas funções para conduzir os padres e os fiéis na fé. Se eles não fazem isto,
os fiéis e os padres devem resistir e procurar guardar a fé. E isto acaba sendo
uma forma de submissão mais elevada.
Filipe: Bem… Mas o que tem a ver com isto a missa dos
ralliés ( Padre de Motu próprio)? Se
for à missa deles vou perder a fé ?
Padre: É necessário considerar o problema sob um outro
aspecto…
Filipe: Sob um outro aspecto?
Padre: Sim, um outro aspecto. A questão de saber se eu vou
perder a fé é capital. Mas, o que é preciso que se interrogue é: qual é a
atitude de fé que convêm diante da missa dos ralliés ( Padre de Motu próprio)? Não existe na sua questão um subtendido,
do tipo: já que é a verdadeira missa, se eu me prevenir, não haverá problemas
comigo, como quando eu bebo um licor. Estou enganado?
Filipe: Não, padre, é assim mesmo!
Padre: Portanto, é preciso considerar o outro aspecto, que
foi explicado há pouco. A missa é antes de tudo um ato público e hierárquico. A
missa de um padre rallié ( Padre de Motu
próprio) é a missa de um padre que, ao menos oficialmente, obedece ao bispo
do lugar e ao papa, logo um padre que vai receber, de vez em quando, o seu
bispo para as cerimônias, um padre que não prega que a nova missa é má,
perigosa para a fé, um padre que vai assim congregar em torno de si fiéis cuja
fé é mais fraca, menos informada a respeito dos sérios perigos que ameaçam a
vida cristã na igreja conciliar, um padre que, se for lógico consigo mesmo,
considerará que a situação da Igreja hoje é grosso modo, normal, de qualquer
modo normal o suficiente para tornar a resistência da Fraternidade São Pio X
ilegítima, um padre que, obedecendo a autoridades liberais e modernistas vai
inevitavelmente se desviar, um padre que, finalmente, trai tudo o que fez D.
Lefebvre, que trai as almas, as engana, fazendo-as crer, através de sua
submissão pública à hierarquia, que o papa conduz verdadeiramente suas ovelhas
e seus carneiros nos caminhos da verdadeira fé…
Filipe: O senhor está exagerando um pouco, padre!
Padre: Assim falava D. Lefebvre no seu tempo! Um padre
rallié ( Padre de Motu próprio),
atualmente, não assume uma posição justa na Igreja. Ele não está em ordem com o
Bom Deus. Não está na verdade. Há nele o conflito entre o desejo de bem fazer e
a submissão às autoridades conciliares. Seus sermões se ressentem disto
obrigatoriamente. Suas revistas, sites, etc., também; haverá documentos da
diocese no fundo de suas igrejas. Existe ainda o sério risco de , com o tempo,
deixar-se levar pela tibieza por causa do contato com fiéis bem menos formados
na fé, havendo também o risco de se deixar atrair por uma doutrina mais
acomodada, ou pela simpatia por fiéis ou padres (da igreja “conciliar”, ndt).
Filipe: Portanto, não se pode jamais assistir à missa dos
ralliés( Padre de Motu próprio)?
Padre: Não se pode jamais desagradar a Deus! Essas missas
não são para nós! Se, por razões excepcionais, acabamos por estar presentes
numa cerimônia de ralliés ( Padre de
Motu próprio), convêm então observar uma atitude discreta, evitando dar a
impressão de que se adere à sua submissão aos bispos ou ao papa.. Por exemplo,
abstendo-se de comungar. Pois é preciso se preocupar com o exemplo que se dá
aos outros.
Filipe: E no domingo, quando não há outra missa?
Padre: Se você compreendeu bem nossa conversa, você tem
condições de concluir por si mesmo que, no domingo, neste caso, não se é
obrigado a assistir à missa de um padre que não confessa publicamente que a
Igreja “conciliar” põe a fé dos fiéis em perigo. Não é possível haver obrigação
nestas condições. Nosso Senhor te dará graças de outro modo, nem que fosse te
recompensando por tua corajosa fidelidade e apego à verdade.
Filipe: Apego à verdade?
Padre: Sim, à verdade. Resumamos um pouco. Dizia no começo:
a missa dos ralliés ( Padre de Motu próprio)
é boa, mas esta não é a questão. A questão é: é verdadeiramente bom
assistir a esta missa? Será que eu adiro verdadeiramente à Igreja, a Nosso
Senhor através desta missa? A resposta é não, porque o padre rallié ( Padre de Motu próprio) não assume uma
posição verdadeira, ele não resiste aos maus pastores, como é sua obrigação.
Ele se engana, e engana os outros. Como você
poderá encontrar ao lado dele, sob sua influência e autoridade de padre,
um verdadeiro amor da verdade, de Nosso Senhor, de sua Igreja, e até mesmo do
papa? Pois ele se engana a respeito de uma questão essencial!
Filipe: Decididamente, estas conclusões vão além do que eu
achava!
Padre: Sim, é preciso reconhecer que não é algo evidente.
Hoje em dia é necessário, como nunca antes, buscar uma formação, saber o que se
faz. Pois o perigo está em toda parte. Mas é também um período extraordinário,
como dizia D. Lefebvre, pois isto nos leva a amar de maneira mais verdadeira à
Igreja, a Nosso Senhor, e a permanecer firmes na fé! E é também o melhor
serviço de caridade que se pode prestar
àqueles que têm dificuldades em compreender todas os aspectos da situação
atual. Sejamos testemunhas da verdade e da vontade de Deus!
Pe. Jacques Mérel, FSSPX
[1] – Os ralliés (em português, aliados) são aqueles que seguem a liturgia tradicional,
mas que fizeram acordos com as autoridades da Roma conciliar. É o caso, por
exemplo, do Instituto do Bom Pastor (IBP), ou da Administração Apostólica São
Maria Vianney, de Campos, (ndt).
[2] – Trata-se de uma conversa fictícia, em estilo
coloquial.
[3] – Um dos povos antigos
que formaram o povo francês (ndt).
Extraído do blog: Missa Tridentina em Vitória.
OBS - Negrito são
meus, e repetidamente para frisar bem
que o Padre que celebra somente a
Missa Tridentina, mas aceita o CVII , nos coloca em risco de perda da fé.
Quanto mais um Padre modernista que irá clebrar a Missa Tridentina.
Excelente. Muito esclarecedor.
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